Blueberry, o lendário tenente mais amado do
Oeste
Eu gosto do gênero
western desde criança, quando eu lia as revistas de histórias em quadrinhos
“Aí, Mocinho!”, “Bonanza”, “Cavaleiro Negro”, “Cisco Kid”, “Epopéia Tri”,
“Paladino do Oeste”, “Reis do Faroeste”, “Tex”, “Zagor”, “Zorro” (“Lone
Ranger”), entre outras, e assistia os seriados televisivos “Bat Masterson”,
“Bonanza”, “Chaparral”, “Daniel Boone”, “Durango Kid”, “Gunsmoke”, “James
West”, “Kung Fu”, “Lone Ranger”, “Paladino do Oeste”, “Rin Tin Tin”, “Roy
Rogers” e outros. Naquela época, meados dos anos 1970, no Brasil, as
publicações, os seriados e os filmes western eram a grande diversão do público
aficionado do gênero; somando-se também que ainda não havia tantas opções de
entretenimento como hoje.
Capa
de “Blueberry” Nº 18 “Nariz Partido”,
Editora Meribérica, Lisboa, Portugal,
1984.
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Em 1987, eu comprei o
meu primeiro álbum “Blueberry”, publicado pela Meribérica, extinta editora
portuguesa, na também extinta Livraria Brasileira, próxima ao Teatro Amazonas,
em Manaus. Os títulos da série e da história, respectivamente “Tenente
Blueberry” e “Nariz Partido”, chamaram a minha atenção, assim como a bela capa
mostrando um homem branco, vestindo uma casaca azul, do exército americano, e
trajes indígenas, e um índio. Eu não sabia que aquela aventura trazia de volta
Mike Steve Blueberry, apelidado de “Tsi-Na-Pah”, pelos índios Apaches, por
causa de seu nariz partido, após cinco anos longe dos seus leitores.
Ilustração de Jijé para a capa do primeiro álbum de “Blueberry”, “Fort Navajo”, publicado, em 1965, por Dargaud Éditeur, Paris, França. |
Eu também não sabia que a
sua longa saga começara no número 210 da revista semanal “Pilote”, de 31 de
outubro de 1963, pelas mãos de dois talentosos mestres da “Bande Dessinée”
franco-belga: Jean-Michel Charlier, o maior roteirista da história em quadrinhos
francófona, e Jean Giraud, o melhor desenhista da 9ª arte de todos os tempos.
“Nariz Partido” (“Nez Cassé”, título original francês do álbum publicado em
1980) apresenta o retorno de Blueberry, após o acidente de trem ocorrido no
final de “Angel Face” (o álbum precedente, lançado em 1975), quando muitos
colecionadores blueberryanos pensavam que o Tenente mais amado do Oeste não
seria mais publicado devido à demora de sua volta às gibiterias e livrarias e à
saída da dupla Charlier & Giraud da Dargaud Éditeur.
Refeitura de parte da capa de “Fort Navajo”, por Jean Giraud, para o
“Portfolio Blueberry in Paris”, Libraire Fantasmagories, Paris, França, 1997. |
Blueberry retorna vivendo
entre os índios Apaches, liderados pelo chefe Cochise e por Vittorio, futuro
chefe da tribo, com o qual disputa a mão de Chini, filha de Cochise. “Nariz
Partido” marca o início do ciclo do Segundo Complô contra Grant. O Crepúsculo
da Nação Apache, que é composto também pelos álbuns “A Longa Marcha” e “A Tribo
Fantasma”. O roteiro de “A Longa Marcha” foi inspirado no acontecimento
histórico A Longa Marcha dos Navajos - “Long Walk” -, em cuja nove mil índios, a
maioria mulheres e crianças, foram obrigados a marchar 500 quilômetros até a
sua nova reserva, no Novo México, onde ficaram por quatro anos, quando centenas
morreram de doenças e de fome, juntando-se às vítimas da marcha forçada.
A minha primeira
experiência com o oficial fugitivo, cuja cabeça estava colocada a prêmio,
acusado de tentar assassinar o Presidente Ulysses Simpson Grant, perseguido por
Wild Bill Hickock, famoso pistoleiro, Gedeon Eggskull, caçador de índios, os
dois grandes cães desse último, Gog e Magog, e pelo exército americano, foi
positiva e me estimulou a procurar mais volumes da série na Brasileira, que me
indicou o representante da editora no Brasil, pois aquela livraria não venderia
mais publicações importadas. Assim, eu fui comprando mais álbuns até a
Meribérica falir, deixando a minha coleção incompleta.
Duas
ilustrações de Blueberry, por Jean Giraud, dos anos 1970, para a Dargaud
Éditeur.
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Anos antes da minha
primeira experiência blueberryana, a extinta Editora Vecchi lançou, em 1980,
“Fort Navajo, uma Aventura do Tenente Blueberry” (seguindo o título inicial da
série na França), que teve apenas dois álbuns, em preto e branco, lançados –
“Fort Navajo” e “Tempestade no Oeste”. O editorial, publicado sobre a histórica
página de guarda da série – Blueberry, a cavalo, inspirado, por Jean Giraud, no
desenhista Jean-Claude Mézières -
no primeiro volume:
Depois de COMANCHE, voltamos à
carga lançando mais uma revista em formato grande: FORT NAVAJO, com as
aventuras do Tenente Blueberry. Esta história, de origem francesa, é escrita
por JEAN-MICHEL CHARLIER e desenhada por JEAN GIRAUD, que não é outro senão o famoso
MOEBIUS, um dos mais aplaudidos desenhistas da atualidade.
Quando GIRAUD começou a desenhar
essa série para a revista francesa PILOTE, estava no início de sua carreira.
Ainda sem atingir seu estilo definitivo, com influências de outros desenhistas,
ele deu início a essa epopéia do faroeste, famosa em seu país de origem há
cerca de vinte anos. Tempos mais tarde, associou-se a outros desenhistas de
gabarito, usando o pseudônimo de MOEBIUS, e foi fundada a firma LES HUMANOÏDES
ASSOCIÉS, que deu origem à badaladíssima METAL HURLANT, uma das mais cotadas
revistas da atualidade.
As histórias de FORT NAVAJO estão
sendo publicadas na mesma ordem original e contamos com os leitores para que
ela obtenha o mesmo sucesso que as outras já consagradas publicações desta
editora.
Em 1990, a Editora
Abril, que lançara, em 1976, o primeiro álbum “Blueberry” no Brasil, “O Homem
da Estrela de Prata”, retomou a publicação do cabeça-quente, teimoso e
insubordinado tenente, dessa vez desde a primeira história, “Forte Navajo”,
saída no número 21 da coleção “Graphic Novel”. A editora lança a série
“Blueberry”, em cores, que dura apenas quatro volumes - “Tempestade no Oeste”,
“Águia Solitária”, “O Cavaleiro Perdido” e “A Pista dos Navajos” – de outubro
de 1990 a janeiro de 1991, os quais, juntando a “Forte Navajo”, perfazem o
ciclo Forte Navajo. As Primeiras Guerras Indígenas. Na capa, os nomes dos
autores são Mœbius e Charlier, porque Jean Giraud é mais conhecido, no Brasil,
pelo seu outro eu, Mœbius, que realizava as histórias em quadrinhos de ficção
científica, enquanto Giraud aquelas de western.
Em 1992, novamente a
Editora Abril prosseguiu Blueberry em uma nova série, denominada “Tenente
Blueberry”, em preto e branco, sem os nomes dos autores nas capas, que durou
também somente quatro volumes – “O Homem da Estrela de Prata”, “O Cavalo de Ferro”,
“O Homem do Punho de Aço” e “A Pista dos Sioux” - de março a junho daquele ano.
Ao que tudo indica, a editora não tencionava continuar a série, pois não
anunciou, no final de “A Pista dos Sioux”, “General Cabeça Amarela”, o álbum
conclusivo do ciclo do Cavalo de Ferro. As Segundas Guerras Indígenas.
Em 2006, Blueberry
voltou a cavalgar no Brasil, na ocasião pela Panini Comics, que publicou o
ciclo Mister Blueberry. O Rei do Pôquer, em três álbuns em cores na série “Blueberry”,
de Charlier e Giraud, sendo os dois primeiros dípticos - “Mister Blueberry” e
“Sombras sobre Tombstone”; “Gerônimo, o Apache” e “OK Corral” – e “Dust”, a
conclusão do ciclo. A editora lançou os dois volumes iniciais no formato
encadernado e o último em brochura, o que gerou reclamações dos leitores.
Blueberry
chega à Casa dos Anjos, nos arredores de Santa
Fé, Novo México. Quadrinho 1 da
prancha 22 do álbum
“Le Hors-la-loi” publicado, em 1974, por Dargaud Éditeur.
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A apresentação da Dargaud
Éditeur da série “Blueberry”:
“Blueberry”
Roteirista: Jean-Michel Charlier
Desenhista: Jean Giraud
Em matéria de western, Blueberry constitui a
referência absoluta. Foi em 1963, que é criado esse personagem, para “Pilote” (1), por Charlier e Giraud. Eles estabelecem de saída um sólido soldado que
surge como o sósia de Belmondo (2). A semelhança se esfumaça ao
longo dos episódios.
Blueberry é um cabeçudo: tinhoso, nem sempre
respeitador do rigor militar, indisciplinado, ele não hesita, às vezes, em
desertar para melhor completar suas missões. O roteiro utiliza todos os lugares
comuns do western americano, com tudo aquilo que ele precisa de reviravoltas e
personagens pitorescos (Mc Clure (3), Angel Face (4), Red Neck, Chihuahua Pearl (5), etc. - sem contar os índios que
são reabilitados pelos autores, ponto de vista adotado também em “Cartland” (6)).
Paralelamente ao ciclo clássico da saga de
“Blueberry”, Giraud desenha, entre 1968 e 1970, a juventude do futuro tenente (7). Essa “série” retoma seu curso, em 1985, sob o lápis de Colin Wilson (8), muito respeitador do estilo imposto por Giraud. Os álbuns,
sucessivamente, têm sido editados por Dargaud (22 títulos, o essencial da
base), em seguida por Fleurus/Hachette (9) (10), depois
por Novédi (11) e, enfim, por Alpen (12) para a novidade desenhada por Vance (13). A Dargaud inicia a reedição dos álbuns
“Blueberry” (14) com novas maquetes e novas cores
(15).
N. C.:
1) “Blueberry” foi lançado na
revista “Pilote” Nº 210, de 31 de outubro de 1963, Dargaud Éditeur.
2) O ator francês Jean-Paul
Belmondo.
3) Jimmy Mc Clure.
4) Angel Face, apelido de
Marmaduke O’Saughtnessy, jovem assassino de aluguel.
5) Chihuahua Pearl, apelido de
Lily Calloway, bela cantora e dançarina de saloon, cuja carreira estava no auge
em Chihuahua, capital do Estado de Chihuahua, México.
6) Jonathan Cartland, personagem
western, de uma série homônima, criado pelo roteirista Laurence Harlé e pelo
desenhista Michel Blanc-Dumont e lançado, em 1974, em “Lucky Luke”.
7) Histórias publicadas em “Pocket
Pilote” e relançadas em álbuns – “La Jeunesse de Blueberry” (“A Juventude de
Blueberry”), 1975, “Un Yankee nommé Blueberry” (“Um Ianque Chamado Blueberry”),
1978 e “Cavalier bleu”, 1979.
8) Colin Wilson desenhou seis
álbuns da série “La Jeunesse de Blueberry” (“A Juventude de Blueberry”) – três
com roteiros de Jean-Michel Charlier e três com roteiros de François
Corteggiani, o atual roteirista da série – de 1985 a 1994.
9) A editora Fleurus publicou “La
Longue Marche” (“A Longa Marcha”), em 1980.
10) A editora Hachette publicou “La
Tribu fantôme” (“A Tribo Fantasma”), 1982, e “La Dernière carte” (“A Última
Cartada”), 1983.
11) A editora Novédi publicou “Le
Bout de la piste” (“O Fim da Pista”), em 1986.
12) A editora Alpen Publishers
publicou “Arizona Love” (“Arizona Love”), volume 23 de “Blueberry”, em 1990,
“Sur ordre de Washington” e “Mission Sherman”, respectivamente o primeiro e o
segundo volume de “Marshal Blueberry”, em 1991 e 1993.
13) William Vance desenhou, com
roteiros de Jean Giraud, os dois primeiros álbuns da série “Marshal Blueberry”,
que foi concluída, no terceiro álbum, “Frontière sanglante”, 2000, pelo
roteirista Jean Giraud e pelo desenhista Michel Rouge.
14) A Dargaud publicou “Blueberry”
de “Fort Navajo” (“Forte Navajo”), 1965, a “Nez Cassé” (“Nariz Partido”), 1980;
retomou a publicação, em 1995, com “Mister Blueberry” (“Mister Blueberry”), e
relançou os álbuns publicados pelas demais editoras.
15) Os álbuns da série “La Jeunesse Blueberry” (“A
Juventude de Blueberry”) desenhados por Michel Blanc-Dumont, foram pintadas, à
exceção de “Gettysburg”, por Claudine Blanc-Dumont, a sua esposa, falecida em
10 de outubro de 2012, que também repintou vários volumes da série “Blueberry”.
Red
Neck, Mike Blueberry e Jimmy McClure, amigos
e companheiros de aventuras. Ilustração do “Portfolio
Blueberry Jean Gir”, publicado, em 1983, pelas edições
Gentiane.
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Atualmente, as minhas
coleções das três séries de Blueberry - “Blueberry”, “La Jeunesse de Blueberry” (“A
Juventude de Blueberry”) e “Marshal Blueberry” – estão completas. Desde a publicação, iniciada em
1963, em partes, no hebdomadário “Pilote” até “Dust”, o último episódio, saído
em 2005, se presencia a evolução literária de Jean-Michel Charlier e a gráfica
de Jean Giraud, nas páginas de “Blueberry”, em roteiros bem estruturados, com
muitas reviravoltas, expostos em cenários com enquadramentos cinematográficos,
os quais, nos últimos álbuns, apresentam a dualidade Gir-Mœbius – as duas faces
de um mesmo artista gráfico.
Um
dos beijos de Pearl e Blueberry. Tira 4 da prancha16 do álbum “Arizona Love”,
publicado, em 1993, por Dargaud Éditeur.
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Ladeado, na
maioria das histórias de “Blueberry”, por Jimmy McClure e Red Neck, seus amigos
e companheiros, Mike Blueberry gosta de jogar pôquer, em cujo tem mais sorte do
que no amor; nesse, procura encontrar o seu par, passando por Chini, filha do
chefe Cochise, Chihuahua Pearl, cantora de saloon, até Dorée Malone, também
cantora de saloon, nos braços da qual termina a sua busca. As aventuras do
Tenente Blueberry - durante o ciclo do Segundo Complô Contra Grant. Parte 1: O
Crepúsculo da Nação Apache, podemos chamá-las de as aventuras de Tsi-Na-Pah e as
de Blueberry, no último ciclo de sua longa saga, aquele de Mister Blueberry. O
Rei do Pôquer -, em cujas se destaca a amizade, continuam a fascinar milhões de
leitores no mundo todo.
Afrânio Braga
N.
A.: O artigo Blueberry, o lendário
tenente mais amado do Oeste foi publicado na revista “Calibre 45 Faroeste”
Nº 1, outubro de 2014, Editora Cultura e Quadrinhos, Ponta Grossa, Paraná,
Brasil.
Blueberry © Jean-Michel
Charlier / Jean Giraud - Dargaud Éditeur
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