Homenagem
a
Jean-Michel Charlier
Criador
de Blueberry, Tanguy & Laverdure, Barbe
Rouge, etc., etc. Jean-Michel Charlier, o mais belo pirata da história em
quadrinhos, faleceu há dez anos, em julho de 1989.
Por
Guy Vidal.
Nessa manhã, eu tentarei nadar contra
a corrente no rio Tempo. Eu quero remontar dez anos atrás. Para atingir 1989,
10 de julho, data da morte de Jean-Michel Charlier, jornalista, homem da
televisão e, sobretudo, roteirista de tantas séries que nos fizeram e nos fazem
ainda sonhar. De Blueberry a Tanguy & Laverdure, passando por Barbe Rouge, Buck Danny, Valhardi, La Patrouille des Castors, Marc Dacier, Jacques Le Gall, Guy Lebleu,
Jim Cutlass, Les Gringos, La Jeunesse de
Blueberry. Mais de 450 roteiros! Passando os rostos de seus amigos, de seus
desenhistas (que ele quase enlouquecia, todos, por seus atrasos de entrega):
Gillain, Hubinon, Uderzo, Paape, Mitacq, Martial, Poïvet, Giraud, de la Fuente,
Gaty, Pellerin, Bergèse, Coutelis, Armand, etc.
Para melhor me lembrar, eu
necessitaria de documentação, estar conectado à Internet, sem dúvida. Eu não
tenho mais que alguns velhos números de “Pilote”, em cujo ele foi, com René
Goscinny, o capitão talentoso de 1959 a 1973.
Era o quê, era como 1989? O muro de
Berlim iria cair (em novembro) e Jean-Michel, que sempre foi anticomunista (isso
que, em certa época, demandava além uma clarividência não evidente, a coragem
certa de se fazer tratar de fascista) e que a História apaixonar-se-ia tanto, não
veria esse acontecimento insólito, a queda de um império.
Tudo isso do qual eu me lembro, era
que ele fazia bonito sobre o átrio da igreja Saint-Cloud onde se celebrava seu
funeral. Isso devia ser na véspera de 14 de julho. À noite, no dia seguinte, a
cidade se incendiaria sob um muito belo fogo de artifício.
Philippe Druillet estava lá e,
enraivecido, fazia sorrir Louis-Gérard, exigindo para si mesmo, o dia vindo: “Um
caixão sem alça, para fazer cocô!” Nós fomos com Jacques Lob. Doente, Jacques
deveria morrer quase exatamente um ano depois. Hoje, todos aqueles que o conheceram
consideram que sua filha, Léonie Lob, tem um verdadeiro talento de cantora.
Em meu nado impossível, eu penso no
livro autobiográfico de Jean Giraud, recentemente publicado, onde ele fala de
Charlier. Eu não sou de acordo com a maneira cuja ele o vê. Para mim, Charlier
– muito belo rapaz nascido em Liège, em 1924, tornar-se, com o tempo,
ligeiramente “envelopado” à la maneira sedutora de um Hugo Pratt – teve êxito,
apesar do porte da gravata e da leitura de Le
Figaro, em tornar-se ao máximo aquilo que se deve poder chamar de “homem
livre”.
N. C.: Integrais “Barbe Rouge” volume 9 a publicar em
junho
de 1999, “Tanguy et Laverdure” em julho do mesmo ano.
“Diga-me, Michel, se um dia tu não
tiveres mais trabalho, o quê é que tu farias?”
“- Oh! Eu me tornaria guia de turismo
no México!” E ele explodia de rir.
Eu penso em Christine, sua mulher, tão
sensível, em Philippe, seu filho, que se parece tanto com ele. Os dois vigiam
essa milagrosa herança de palavras, de imaginário. Na fotografia desbotada, há,
sem dúvida, também a silhueta de uma menina, que deve ser, no presente, uma
moça. Só ela poderia incomodá-lo quando ele estava em frente à sua máquina de
escrever.
Eu sei que sou censurado,
frequentemente, de ser o senhor-da-HQ-que-acha-que-todo-o-mundo-é-belo-é-gentil.
Isso não é de todo um fato verdadeiro, mas... ...quase. Isso é devido ao fato que
eu tenho tendência desde muito tempo em nos ver todos naufragados de alguma
forma agarrados às boias de vento. Eu escrevi a ele, uma vez, em Forest
(olha!). Ele me respondeu que não: ele não se sentia de todo assim. Demais
orgulhoso? Charlier o admitia mais facilmente, mas isso o fazia rir. Dele,
frequentemente. Das situações engraçadas da vida de todos os dias. Eu nunca o
ouvi rir, maldosamente, do quê quer que seja.
Jean-Michel amava as palavras, amava
inventar as histórias, amava as pessoas, a boa comida, a amizade, as viagens, a
pintura, certa música, os desenhos de seus companheiros, o amor e as
brincadeiras de colegial. Foi um magnífico bon vivant que, de um gesto, de um
riso, vos convida fraternalmente a compartilhar o banquete.
Eu cheguei a perguntar-lhe: “Tu estás
contente com tua vida, Jean-Michel?” e ele me respondeu: “Sim. Eu queria
conhecer o mundo. Restam-me ainda algumas coisas por ver, mas, bom, no
conjunto, eu fiz aquilo que eu queria.”.
Nesse verão, para saudar o 10º
aniversário de seu falecimento, Dargaud Éditeur publica duas compilações
especiais, uma de Barbe Rouge (em
junho), suas últimas histórias, a outra de Tanguy
& Laverdure (em julho). Esses dois volumes são completados pelo rápido
sobrevoo de sua vida, um texto que eu escrevi, em 1995, para acompanhar uma
exposição, consagrada a ele, em Angoulême. Leiam-no. Vocês verão, mesmo se o
retrato não está completamente bem sucedido, a qual ponto o mais belo pirata da
história em quadrinhos franco-belga era cativante.
E em seguida, sobretudo, leiam as
histórias que ele escreveu (e que felizmente Giraud, Bérgese, Rossi, Bourgne,
Perrissin, Corteggiani, Blanc-Dumont continuam). Vocês verão ali, sobretudo, quanto
a aventura é bela quando ela é contada por Jean-Michel Charlier. Como um fogo
de artifício...
N. C.: Jimmy McClure e Mike Blueberry por Jean Giraud.
Fonte:
La Lettre de Dargaud. L’officiel de la bande dessinée. Nº 47, mai – juin 1999. Dargaud
Éditeur, Paris, France.
Hommage
à Jean-Michel Charlier © Guy Vidal – Dargaud Éditeur 1999
Afrânio Braga
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