N. C.: 1) Página 62; 2) Blueberry em "Le Spectre aux balles d'or", prancha 11, quadrinho 8, Charlier, Giraud, Dargaud Éditeur, 1972. |
A
longa saga
de
Mike Steve
Donovan
"Blueberry"
Gir/Mœbius
(Jean Giraud)
[Nogent-sur-Marne,
1938].
Desenhista
francês de fama mundial, criou Blueberry e a saga do Incal.
N. C.:
Jean Giraud faleceu em 2012.
Jean-Michel
Charlier
[Liège,
1924-1989].
Roteirista
belga de histórias de aventuras, idealizou o personagem Blueberry.
"Para
mim, história em quadrinhos sempre rimou com western.”. Com
essa frase, citada a Yves-Marie Labé, em uma entrevista pela Internet (1998),
Jean Giraud, mais conhecido em todo o mundo com o pseudônimo de Mœbius, com o
qual assina os quadrinhos de gênero fantástico e de ficção científica, sublinha
a própria predileção pelo western.
Nascido
em 8 de maio de 1938 em Nogent-sur-Marne, após o divórcio dos pais, Jean vive
com os avós em Fontanay. Com tenra idade, se apaixona pelo desenho, como
atestam os cadernos escolares cheios de colts e selas de cavalos, provavelmente
desenhados sob a influência de autores da época: Marijac, Giffey, Lauralic ou o
estadunidense Fred Harman. O pai o introduz bem cedo nos fascinantes mistérios
da literatura de ficção científica nas páginas da revista Fiction. "Daquele
momento, na minha vida haverá de um lado o western e do outro a ficção
científica. Nesse sentido, se Blueberry está pela parte de minha mãe e do
México. Mœbius está, ao invés, da parte de meu pai e da ficção
científica." (Giraud).
À
idade de dezesseis anos frequenta o biênio do instituto de Arts Appliqués, onde
conhece Jean-Claude Mézières (autor de “Valérian”), iniciando nesse ínterim a
colaboração com diversos semanais: “Cœurs Vaillants”, “Fripounet et Mansette” e
“Far West”. Nesse último, publica o humorístico “Frank et Jérémie”, ambientado
no Oeste selvagem.
Uma
estada de nove meses no México, local de residência da mãe, se transforma em
uma espécie de viagem de iniciação, em cuja, além de ter as primeiras
experiências de vida (sexo, maconha), e interessar-se por esoterismo e magia,
nutre a própria fantasia com as cores e com as paisagens daqueles lugares
fascinantes, que se tornam uma constante em sua arte. Afirma em seguida Gir: "O
Oeste é um local extraordinariamente fotogênico. Não somente a paisagem, mas a
gente e a luz. (...) Pois existe o Oeste tal qual tenho visto habitando-o. E
essa viagem ao México, que fiz jovem e que me deu a sensação de ter captado
algo único." (“Il était une fois Blueberry”, Daniel Pizzoli).
Gir, Le spectre aux balles d'or. N. C. 1) Página 64; 2) "O Espectro das Balas de Ouro", prancha 21, Jean-Michel Charlier, Jean Giraud, Dargaud Éditeur, 1972. |
Retornando
à pátria, durante o serviço militar na Alemanha e na Argélia, colabora com
“Forces armées”, revista do Exército, em cuja publica ilustrações e uma história,
patriótica, intitulada “Patrouille éröique”.
O
encontro com o artista belga Jijé cria uma consistência artística com o jovem
Jean, que faz a arte-final do episódio “La Route de Coronado” (1960), de “Jerry
Spring” – recorda Gir: "Deu-me um modelo de atitude no desenho,
uma espécie de honestidade em relação à realidade. E uma maneira de observá-la
e transcrevê-la, com uma espécie de ética no traço, no ritmo, na utilização do
preto." (Pizzoli).
Em
1963, no mensal satírico “Hara-Kiri”, Giraud assina com um pseudônimo, Mœbius,
algumas histórias curtas oscilantes entre o surrealismo e o horror.
No
início dos anos Sessenta, Jean-Michel Charlier, prolífico roteirista e
redator-chefe do semanal “Pilote”, propõe, em vão, a Jijé desenhar uma série
western: esse sugeriu que se dirigisse ao jovem Giraud. O resultado aparece no
número 210 (31 de outubro de 1963) com a primeira parte da série “Lieutenant
Blueberry”, assinada com o pseudônimo Gir: caso único de dicotomia artística
(Gir/western e Mœbius/ficção científica) em um desenhista de histórias em
quadrinhos.
1975
se revela um ano histórico para os quadrinhos europeus, quando Giraud, Philippe
Druillet, Jean Pierre Dionnet e Bernard Farkas fundam Les Humanoїdes Associés,
editora da revista “Métal Hurlant”: nela, Mœbius dá livre desafogo à própria
criatividade com “Arzach” e “Le Garage Hermétique”, obras que mudam os
cânones da HQ ocidental, assim como concebidos até então. O autor se apaixona,
em seguida, pelas disciplinas orientais, que o levam a se tornar vegetariano e
a transferir-se por breve tempo ao Tahiti.
Atraído
pelo cinema, decide passar a viver em Los Angeles, onde cria o fascinante
universo de John Difool, do Incal e do Metabarão com textos do diretor
Alexandro Jodorowsky. Em 1979, sempre com Charlier, desenha para os Humanoїdes
Associés uma nova série western, “Jim Cutlass”, que retomará dez anos depois, à
morte de Charlier, escrevendo os roteiros e confiando os desenhos ao jovem
Christian Rossi.
De
volta a França (1988), torna-se seguidor da filosofia New Age, cria “Le monde
d'Edena”. Funda a sociedade Starwatcher Graphic, que traduz em inglês, para a
Marvel, as suas obras. Vários são, além disso, os seus interesses multimídia:
cinema, animação, videogames e publicações de autor. A ele foram dedicadas
mostras em todo o mundo.
A
longa e honrosa carreira de Gir pode se identificar com Blueberry,
personagem de crescente sucesso, que o autor realizou sem interromper por
trinta e oito anos até hoje, empenhando-se primeiro como desenhista e depois
como roteirista e desenhista.
Soldado
por acaso
Os
episódios de “Blueberry” abraçam um período da história norte-americana, que
vai de 1861 a 1881 e são acumuláveis em diversos ciclos, correspondentes
igualmente aos momentos evolutivos do estilo artístico-narrativo de Giraud:
eles refletem também as mudanças ocorridas no gênero western, sobretudo no
cinematográfico.
Inicia-se
então, com o clássico herói-soldado, que salva o forte assediado pelos índios,
se prossegue com as temáticas desenvolvidas pela revalidação da cultura
indígena e com as brutais contaminações dos spaghetti-western por
depois terminar com o protagonista, já cansado e desiludido aventureiro,
testemunha passiva da civilização que enlouquecera pelo fascinante mundo do
Oeste.
Durante
a Guerra Civil norte-americana, o jovem de dezessete anos Mike Steve Donovan,
filho de um proprietário do profundo Sul, é forçado, por uma injusta acusação
de homicídio do futuro sogro, a fugir para o Norte, onde se alista no Exército,
assumindo o nome de Mike Blueberry (em Português, mirtilo).
Crescido
em um mundo de uniformes, obediência e violência, pelo qual parece ser lançado
sozinho nas histórias mais recentes, ele se revela logo impaciente à disciplina
militar, obrigado frequentemente pelos acontecimentos a ultrapassar os limites
do lícito. É altruísta, leal e aventureiro, hábil com o revólver e os punhos,
engenhoso em idealizar planos para evitar as armadilhas dos maus de plantão,
como convém a um personagem dos quadrinhos, é amante do uísque, das mulheres e
do pôquer, distante, então, milhares de quilômetros dos adiamantados heróis dos
quadrinhos da época, em breve um anti-herói. "Contrariamente a
quanto se poderia acreditar, as características do personagem militar renegado
não provém de mim, mas sim de Jean-Michel Charlier." (Giraud).
Essa sua personalidade exuberante e insólita, unida a tramas interligadas e
desenhos de ótimo nível asseguravam um sucesso duradouro ao jovem Mirtilo em
toda a Europa e além, tornando-se o porta-bandeira dos quadrinhos franceses no
mundo.
Nos
primeiros episódios, o rosto do personagem é baseado naquele do ator Jean-Paul
Belmondo, conhecido por papéis de simpático canalha, em seguida, tal semelhança
se atenua até o aspecto atual: um misto de patifaria e de
"sex-appeal".
Na
saga, os autores não parecem levar em conta, voluntariamente ou não, a
sincronia entre as datas dos acontecimentos históricos e a sequência temporal
dos eventos na vida dos personagens, fato esse que interessa relativamente os
leitores, os quais pretendem, dos autores, narrativas emocionantes e não biografias
didáticas.
As
Guerras Indígenas (1867 – 1868)
Em
1868, o General Custer massacra os Cheyennes em Wichita River, enquanto Sherman
abandona as Black Hills à procura do chefe Red Cloud. Nesse mesmo ano, se
desenvolve o primeiro ciclo de “Blueberry”, cujo teatro de ação compreende o
Arizona, o Novo México e o famoso Rio Grande na fronteira mexicana do Texas:
lugares renomados da epopeia western.
Em “Fort
Navajo” (“Forte Navajo”), “Tonnerre à l'ouest” (“Tempestade no Oeste”),
“L'Aigle solitaire” (“A Águia Solitária”) e “Le Cavalier perdu” (“O Cavaleiro
Perdido”), os autores introduzem Blueberry, de serviço em Forte
Navajo, pronto a enfrentar a enfrentar uma sangrenta rebelião da nação Apache,
provocada pelo próprio superior, o Major Bascom: da insurreição participam
Navajos, Jicarillas, Chiricahuas, Tontos e Mescaleros, guiados por Cochise
(cujo rosto lembra aquele do ator hollywoodiano Jeff Chandler), Natchez,
Charriba e Quanah, o mau de plantão. O bom senso de Mike impediu a explosão de
um sangrento conflito. O nosso herói faz amizade com Jimmy Mac Clure, um velho
beberrão que se torna seu parceiro, com o mestiço Crowe e com os regressos
sulistas Finlay e Kimball.
O
roteirista Charlier reuniu os clichês de Hollywood na Cavalaria dos Estados
Unidos: índios que atacam o forte, perseguições nos cânions, tudo temperado com
aquele espírito de admiração pela população indígena norte-americana, misturado
à condenação pelo genocídio praticado nela, que permeou a cultura dos anos 60.
Charlier, afirma Gir, se refez à "própria experiência pessoal do
Oeste, onde andou. Retomou marcado e com um desejo muito forte de fazer um
western. Inseriu a sua cultura cinematográfica. (...) Utilizava uma situação
histórica para prosseguir a intriga". (Pizzoli).
De um
ponto de vista artístico, estamos distantes da arte habitual de Gir: no início,
é evidente a influência de Jijé, que assina a capa do primeiro volume, as
pranchas 17 a 38 de “Le Cavalier perdu” e de maneira anônima aquelas 33 a 38 de
“Tonnerre à l'ouest”, em demonstração da estreita ligação entre os dois
autores. Tal influência se nota nos rostos dos guerreiros e naqueles dos outros
protagonistas, pouco caracterizados: o rosto de Mike é afilado, com um nariz
que parece aquilino e não quebrado, como deveria. Em Gir, a construção dos
quadrinhos, na prancha desenhada, apresenta um agradável efeito dinâmico,
graças a uma maior pesquisa dos detalhes e um vigor na representação dos
cavalos.
Recentemente,
os quatro álbuns foram recolorizados por Claudine Blanc-Dumont, que substitui
com cores mais realistas os inverossímeis fundos de cor verde e fúcsia da
primeira pintura.
N. C.: Os autores não citam “A Pista dos Navajos”,
o quinto episódio de “Blueberry”, que completa o Ciclo Forte Navajo. As
Primeiras Guerras Indígenas, em As Guerras Indígenas (1867 – 1868),
esse álbum é citado somente na Cronologia de Blueberry.
A
Estrela de Prata (verão de 1868)
“L'Homme
à l'étoile d'argent” (“O Homem da Estrela de Prata”), episódio colocado entre o
primeiro e o segundo ciclo, é uma história contada em um único volume.
O
herói, despido momentaneamente dos hábitos militares, torna-se xerife da
cidadezinha de Silver Creek, em cuja deve repor a Lei, enfrenta os famosos
irmãos Bass, nisso ajudado por Mac Clure e pela professorinha Jessie March, o
clima é aquele de “Onde Começa o Inferno”. Ainda que seja uma das histórias
menos reeditadas de toda a saga, o estimulante tema narrativo de Blueberry
xerife será utilizado outras vezes.
A
Ferrovia (inverno de 1868)
A
epopeia western deve grande parte do fascínio também à conquista dos imensos
territórios inexplorados, que foram ligados às grandes cidades costeiras graças
às construções das redes ferroviárias, com todos os problemas conexos à
travessia dos territórios indígenas. E Charlier, roteirista atento, não podia
não inserir Blueberry em um contexto similar. A ação se desenvolve na fronteira
entre Nebraska e Wyoming, prosseguindo no Colorado e nas Black Hills, símbolo
do declínio da nação indígena.
“Le
Cheval de fer” (“O Cavalo de Ferro”), “L'Homme au poing d'acier” (“O Homem do
Punho de Aço”), “La Piste des Sioux” (“A Pista dos Sioux”) e “Général Tête
Jaune” (“General Cabeça Amarela”) contam a história da construção da Union
Pacific (1864-1869), primeira linha transcontinental aprovada pelo Congresso
norte-americano, contrastada pela rival Central Pacific. Charlier descreve os
incômodos provocados pela travessia da terra dos Sioux e a feroz reação desses
últimos. Tal fato torna-se o pretexto para um genocídio de índios desarmados
perpetrado por um sanguinário militar, o General Mac Allister, extraído por
Charlier da controversa figura de Custer.
Para
enfrentar a revolta e repor a paz naqueles territórios, Mike deve conquistar a
confiança de Sioux, Cheyennes e Arapahos guiados por Red Cloud, Sitting Bull e
Crazy Horse.
Bem
delineado é o personagem do pistoleiro Jetrho Steelfingers (assim apelidado por
uma prótese de ferro que substituía u'a mão) pago pela Central Pacific,
encarnação dos maus, de grandes filmes, interpretados por Jack Palance e por
Lee Van Cleef. No curso da história, o leitor encontra o guia Red Neck Wooley
(que se torna inseparável de Mike, juntamente com Mac Clure), a gorducha Guffie
Palmer, pretensa diretora de uma companhia de atores, na realidade proprietária
de um bordel itinerante, e o General Dodge. A trama resulta um excelente
prelúdio as melhores aventuras de Blueberry.
Começa
a tomar forma o estilo de Gir, caracterizado por uma arte minuciosa mesmo se
privada ainda de unidade estilística, enquanto o autor alterna o uso de pincel
e caneta, parece, além disso, obcecado pela reprodução das dobras de qualquer
tipo, obtidas com pinceladas, os quadrinhos são sobrecarregados de balões e
personagens que, às vezes, tornam a leitura dificultosa.
Cativantes
as cenas reproduzindo a vida nos saloons, aquelas dos ataques aos trens e da
batalha na neve entre a Cavalaria e os índios. Estranhamente, “L'Homme au poing
d'acier” é o único episódio em cujo Giraud assina as pranchas com o sobrenome
por inteiro.
Gir, Jetrho Steelfingers. N. C.: 1) Página 67; 2) Segunda versão do desenho da capa americana do álbum "Steelfingers", Charlier, Mœbius, Epic 1991. |
Gir, Le Général Tête Jaune, primeiro quadrinho, inédito no volume (1968). N. C.: Página 68. |
A Mina
Perdida do Alemão (verão de 1869)
Em “La
Mine de l'Allemand perdu” (“A Mina do Alemão Perdido”) e “Le Spectre aux balles
d'or” (“O Espectro das Balas de Ouro”), os autores contam a mina do alemão, um
mito entre os garimpeiros. Mike é xerife da cidadezinha de Palomito, com Mac
Clure vice-xerife, mas a coluna da história é a figura do pretenso barão
prussiano Werner Amadeus Von Luckner, mais conhecido entre ladrões, prostitutas
e mineradores com o apelido de Prosit; fazem parte os Apaches e Wally e Cole,
uma dupla de assassinos. Mike consegue impor a ordem após um banho de sangue.
O
roteiro magistral e tecnicamente perfeito de Charlier torna mais lento o ritmo
da narrativa, toda a ação se concentra em poucos personagens; se inicia as
mortes espetaculares dos maus, com efeitos derivados dos spaghetti-western.
E o
que dizer das rochas, material natural onipresente na saga de Blueberry?
Recordações talvez dos cenários admirados durante o período no México, Gir as
ilustra obsessivamente, além de que não existe cena ao ar livre na
qual elas não estejam presentes.
O
efeito de relevo em rostos em primeiro plano, obtido com o traçado minucioso e
o uso alternado de quadrinhos horizontais e verticais, movimenta a leitura da
história, considerada por Gir o momento da virada na própria arte, porque
consegue liberta-se das influências de seus inspiradores.
O Ouro
Confederado (agosto de 1869)
Em
“Chihuahua Pearl” (“Chihuahua Pearl”), “L’Homme qui valait 500.000$” (“O Homem
Que Valia $500.000”) e “Ballade pour un cercueil” (“Balada para um Caixão”), os
autores narram um acontecimento que revira a vida de Mike, repercutindo nas
histórias narradas nos sucessivos 14 anos. O México é o centro da ação, com
regiões assoladas, os vilarejos semi-rochosos com as casas em pedra branca e as
cantinas.
Mike
foi encarregado pelo General Mac Pherson, conselheiro militar do Presidente
norte-americano de recuperar, no México, o ouro dos confederados: para ser
livre em executar tal missão, foi arbitrariamente expulso do Exército por uma
corte disciplinar. Após mil peripécias, perseguições e mortes em cadeia,
descobre-se que o tesouro já fora furtado pelo governo mexicano para financiar
a revolta contra os invasores franceses guiados pelo Imperador Massimiliano
d’Asburgo. O resultado é uma injusta acusação contra Blueberry e uma igualmente
injusta condenação a trabalhos forçados impostos pelo próprio governo
norte-americano.
No
curso da narrativa, o leitor encontra Chihuahua Pearl, linda cantora, além de
decidida cantora, cuja elimina a estereotipada figura feminina apresentada
pelos autores nos ciclos precedentes; o Comandante Vigo, oficial do Exército
Mexicano, encarnação física do mexicano velhaco e traidor; Finlay e Kimball,
com o seu bando de sulistas regressos; o patético e cruel Lopez, Governador do
Estado de Chihuahua; e o vigarista Boudini.
A
trama, densa de acontecimentos que se sucedem em ritmo premente, é emocionante
e digna das películas de Sergio Leone, o qual atinge abundantemente. O traço de
Gir torna-se extravagante, curvilíneo e extremamente agradável. O estilo muda
de um volume a outro, somente no último episódio usa o recurso do
microtracejado, que torna rostos, roupas e paisagens como esculpidas por um
escultor. As cores são usadas de maneira expressionista. No volume “Ballade
pour un cercueil”, Charlier imagina uma biografia de Blueberry, quase se
tratando de um personagem realmente existido.
O
Complô (setembro de 1869)
“Le
Hors-la-loi” (“O Fora da Lei”) e “Angel Face” (“Angel Face”) são a continuação
do ciclo precedente: mostram Mike, encarcerado e com os cabelos raspados a
zero, que foge da penitenciária militar de Francisville (Alabama) para frustrar
um complô planejado para prejudicar o Presidente Grant. O próprio, durante uma
visita à cidadezinha de Durango, deveria cair vítima de um Killer de mira
mortífera, Angel Face, assim apelidado pelas belas feições. Em conluio com os
autores do atentado, reencontramos Guffie Palmer. A narrativa termina, outra
vez, com uma iníqua incriminação do herói, não obstante haver salvo a vida do
Presidente dos Estados Unidos da América.
A
história é fortemente influenciada pelos dramáticos atentados aos Presidentes,
que, repetidamente, deixaram funesta a vida política dos Estados Unidos. Em
particular, a teoria do complô parece referir-se ao assassinato de John F.
Kennedy, em Dallas (1963).
Graças
ao uso do microtracejado e de detalhadas reconstruções cenográficas, “Angel
Face” resulta em um dos melhores episódios de toda a saga.
Gir, Angel Face (1975). N. C.: 1) Página 69; 2) "Angel Face", prancha 2, quadrinho 1, Charlier, Giraud, Dargaud Éditeur. |
A
Nação Navajo (inverno de 1871)
Entre
“Angel Face” (“Angel Face”) e o sucessivo “Nez Cassé” (“Nariz Partido”)
transcorrem cinco anos, um período turbulento, em cujo os autores trocam de
editoras (Fleurus & EDI 3 BD, Hachette & Novedi, Alpen Publishers) para
depois retornar à Dargaud.
“Nez
Cassé” (“Nariz Partido”), “La Longue marche” (“A Longa Marcha”) e “La Tribu
fantôme” (“A Tribo Fantasma”) descrevem a fuga para o México de um punhado de
índios reclusos pelo Governo Federal em uma reserva-prisão, símbolo de declínio
da Nação Apache, um tempo altiva e temida.
Graças
à inteligência do fugitivo Mike, ‘adotado’ pelo velho chefe Cochise, como o
nome de Tsi-Na-Pah, a tribo foi conduzida a salvo com a ajuda da bela e doce
Chini, vencendo a resistência dos jovens guerreiros chefiados por um colérico
Vittorio e fugindo da perseguição dos Casacas Azuis guiados por Eggskull, um
sobrevivente da prática do escalpo; há também o famoso pistoleiro Wild Bill
Hickok, que, porém, não encontra Mike.
Estilisticamente
domina o traço simplificado e extravagante, típico da produção registrada
Mœbius daqueles anos, a arte de Gir próxima ao virtuosismo graças ao uso da
técnica ponto-traço e uma articulada construção das pranchas.
Os
autores iniciam o processo de humanização do personagem, a começar pelo aspecto
físico: as costeletas tornam-se grisalhas, conferindo ao seu rosto um ar mais
maduro e sexy.
O
Atentado (verão de 1872)
“La Dernière
carte” (“A Última Cartada”) e “Le Bout de la piste” (“O Fim da Pista”)
representam o final dos acontecimentos iniciados com a vicissitude do ouro
confederado. A ação se desenvolve em Tucson e em Chihuahua.
Com a
ajuda de Chihuahua Pearl, Red Neck e Mac Clure, Mike consegue se aproximar do
cruel Vigo, o qual na hora da morte lhe entrega os papéis que provam a sua
inocência. Na tentativa de encontrar Grant, Mike consegue frustrar outro complô
planejado pelos mesmos conspiradores do atentado anterior, guiados por um
misterioso chefe que, no último momento, se revela ser o rancoroso General Mc
Allister. Agradecido, Grant reabilita Mike e permite que ele dê baixa do exército.
A Duke Stanton, pretendente de Pearl, Charlier reserva um futuro aparentemente
róseo. A incrível reabilitação demonstra que a trama da história foi pouco
pensada.
O Amor
(1889?)
Em
1989, faleceu, infelizmente, Charlier. “Do ponto de vista pessoal, a sua
morte física representou para mim um grande drama que me marcou profundamente a
vida.” – recorda Gir (Giraud).
Tanto
Gir, quanto Blueberry, devem tomar uma decisão importante: o primeiro assume a
honra do roteiro, levando ao final o argumento incompleto de “Arizona Love”
(“Arizona Love”), refutando-se em transformar Mike em scout do Exército como
havia proposto Charlier, o segundo decide contrair núpcias com a sempre mais
bela Chihuahua Pearl, a única mulher capaz de reter-lhe a cabeça.
É
então uma história de ruptura com o passado, impensável com Charlier vivo: não
há mortos assassinados; Mike não deve salvar alguma comunidade e não deve
resolver qualquer conflito militar, porém, mais simplesmente decide pensar em
si mesmo, há uma cena de amor com Mike e Pearl nus e até uma cena onírica.
Emerge
predominantemente o tema da sexualidade, em sintonia com as temáticas do
“nouveau western”.
Para a
capa do volume, Gir inspirou-se no cartaz de “E o Vento Levou...”, obra-prima
do western romântico: Blueberry similar a Clark Gable, mesmo se menos divo e
igualmente desafortunado.
A sua
tentativa de salvar a bela aventureira de um casamento por interesse com o
citado Duke Stanton, em troca de um por amor, fracassa porque nela a cobiça por
dinheiro leva a melhor sobre o Cupido.
Ao
desiludido Mirtilo não resta outra coisa para fazer que enfurnar-se em uma
cidade da fronteira, à espera do próximo encontro com a esplêndida Pearl.
Um
frenético clima de contínua perseguição (todos os personagens se perseguem
entre si) torna agradável a leitura do episódio, permeada por uma sutil veia
humorística. Essa história contém uma desatenção narrativa de Gir, porque se
passa em 1889, enquanto as sucessivas em 1881, deixando um vazio de vários anos
na vida do herói.
Gir, Chihuahua Pearl (1990). N. C.: 1) Página 71; 2) "Arizona Love", prancha 14, quadrinho 6, Charlier, Giraud, Dargaud. |
Mister
Blueberry (julho-agosto de 1881)
Um dos
acontecimentos da epopeia western que mais tem impressionado a fantasia popular
foi o duelo do O. K. Corral, como atestam as numerosas adaptações
cinematográficas e quadrinhísticas, entre as quais a ótima versão do saudoso
Rino Albertarelli.
Gir, desenho preparatório para Mister Blueberry (1995). N. C.: 1) Página 72; 2) "Mister Blueberry", prancha 44B, Charlier, Giraud, Dargaud Éditeur. |
Também
Gir propõe uma reconstrução do famoso duelo; na trama do novo ciclo é inserida
a fuga de Gerônimo, chefe dos Apaches Chiricahuas, que, de 1880 em diante, por
muito tempo coloca em xeque o Exército dos Estados Unidos da América.
Em
“Mister Blueberry” (“Mister Blueberry”), “Ombres sur Tombstone” (“Sombras Sobre
Tombstone”) e “Geronimo, l’Apache” “Gerônimo, o Apache”) os protagonistas são
todos conhecidos: os irmãos Earp, Doc Holliday, os irmãos Clanton, Gerônimo, o
nosso herói, obviamente, e a cidadezinha de Tombstone, verdadeira protagonista
da história, cuja frenética vida e atmosfera de cidade da fronteira são
habilmente reconstruídas (sobretudo o saloon!) com uma miríade de personagens
secundários.
O
pobre Mike é reduzido a coadjuvante, sendo envolvido marginalmente naquele
acontecimento, mesmo porque se aburguesou, tornando-se jogador profissional de
pôquer: uma pessoa qualquer que nada tem a ver com o heroico personagem das
histórias precedentes!
O
infortúnio, além disso, se enfurece contra ele quando é ferido nas costas. O
indômito herói se transforma em um homem consciente da própria fragilidade;
forçado ao leito, Mike, passa o tempo lendo “Moby Dick” e recordando em um
longo “flash-back” um encontro anterior acontecido com o chefe Gerônimo. Para
curar as suas feridas, também amorosas, pensa em outra cantora, a provocante
Dorée Malone.
A
trama cria no leitor uma sensação de confusão por causa do excessivo número de
personagens nas histórias e de quadrinhos (até 14 em uma prancha) que sufocam o
desenho do grande artista.
As
Origens do Mito
“La
Jeunesse de Blueberry” (“A Juventude de Blueberry”) é o título de uma série
paralela àquela principal criada por Charlier e Gir para contar o passado de
Mike; na realidade, após os primeiros episódios em tal sentido, o tema se
focalizou nos anos da sua carreira no Exército nortista, durante a Guerra Civil
entre os Confederados e os Unionistas.
Os
acontecimentos narrados revelam atrocidades e abominações provocadas por ambas
as partes, em um contexto preciso de referências históricas e geográficas: os
personagens coadjuvantes são os protagonistas da guerra, os lugares citados são
aqueles onde efetivamente se desenrolam os fatos narrados – Georgia, Missouri,
Kansas e Tennessee.
Também
nessa série é possível distinguir uma subdivisão nos episódios narrados.
A
Juventude (1861-1863)
“La
jeunesse de Blueberry” (“A Juventude de Blueberry”), “Un yankee nommé
Blueberry” (“Um Ianque Chamado Blueberry”) e “Cavalier bleu” (“Cavaleiro Azul”)
reeditam, em cores, as histórias curtas publicadas, entre 1968 e 1970, em
“Super Pocket Pilote”.
Em
1861 explode um conflito entre os Estados industriais do Norte e aqueles
agrícolas do Sul; a causa é uma motivação humanitária (o escravismo, segundo a
História oficial), para mascarar interesses econômicos contrastantes. O jovem
de 18 anos Mike Steve Donovan, noivo da bela Harriet Tucker, é injustamente
acusado da morte do futuro sogro. Libertado pelo amigo, Lewis Norton, é forçado
a fugir rumo ao Norte, onde se alista no Exército com o nome de Mike Blueberry.
Desde o início, o jovem se encontra envolvido em vicissitudes militares que o
projetam atrás das linhas inimigas: uma ideia, essa, reutilizada nos episódios
seguintes.
Gir, Ombres sur Tombstone (1997). N. C.: 1) Página 73; 2) "Sombras sobre Tombstone", prancha 34, Charlier, Giraud, Dargaud Éditeur. |
Charlier
recorre a esquemas e personagens retomados da série principal ou que serão
utilizados nessa: a noiva Harriet, contemporânea de Chihuahua; o disfarce de
mulher para Mike, como em “Le Hors-la—loi”; e a injusta acusação de traição,
como em “Ballade pour un cercueil” (Pizzoli).
Descobrimos
que em Chickamanga, em 1863, um golpe de muleta, desferido pelo General Dodge,
fratura o septo nasal de Mike.
A
impressão de tais breves episódios difere daquela da saga principal, pois foram
concebidos para um formato de bolso com seis quadrinhos por página em preto e
branco; infeliz é o resultado da reedição em cores na edição cartonada, demais
escuro e pouco legível; o episódio “Tonnerre sur la Sierra” (publicado em
“Cavalier Bleu”) se distingue por ter sido concebido somente por Gir e pelo
estilo caricatural por ele usado, em confirmação de sua contínua pesquisa
artística.
Quantrill
(primavera de 1863)
Em
1985, Charlier decide escrever histórias longas e originais para essa série e
as confia ao neozelandês Colin Wilson, cujo traço rápido e nervoso está quanto
mais longe se possa imaginar da arte de Gir: os rostos das mulheres, apenas
rascunhados, nada têm em comum com aqueles angelicais e perturbadores do seu
predecessor.
Em
“Les démons du Missouri” (“Os Demônios dos Missouri”) e “Terreur sur le Kansas”
(“Terror no Kansas”), o jovem Mirtilo está às voltas com o famoso Quantrill,
chefe de um bando de “jayhawkers”, bandidos sulistas que ensanguentam Kansas e
Missouri, mesmo após o fim da guerra, e com o igualmente sanguinário Senador Jim
Lane, chefe de uma brigada de vigilantes nortistas. Mike se encontra
encurralado entre esses dois fogos, sem conseguir apagá-los, ajudado pela bela,
mas desafortunada, Nugget Harrington.
A
Ferrovia (1863?)
Tema
de “Le raid infernal” (“O Raid Infernal”) e “Poursuite impitoyable” (“Perseguição
Implacável”) é o trem, rápido meio de transporte que revoluciona o modo de
fazer as guerras no século XIX, motivo pelo qual abundam cenas de trens,
tiroteios nos vagões e descarrilamentos.
Encarcerado
na prisão de Rome (Georgia), Mike consegue fugir usufruindo da habilidade de
jogador de pôquer; durante a fuga faz amizade com o Sargento Grayson e o negro
Homer, que, daquele momento, tornam-se os seus parceiros. No palco irrompe
Harry S. Bowman, um impiedoso assassino que tenta de todas as maneiras eliminar
o nosso herói.
De
“Poursuite impitoyable” em diante, assume os textos François Corteggiani,
conhecidos dos leitores italianos pelos roteiros de “Capitan Rogers”, desenhado
por Giorgio Cavazzano.
Ele
demonstra ser um hábil roteirista, à altura de Charlier, capaz de construir
sólidas tramas, que prendem o leitor.
Atlanta
(1864)
Em
“Trois hommes pour Atlanta” (“Três Homens para Atlanta”) e “Le Prix du sang”
(“O Preço do Sangue”), o General Sherman envia Mike com os seus dois parceiros
para Atlanta, para verificar o estado das fortificações inimigas e
possivelmente destruir as suas provisões alimentares. Infelizmente, na cidade
encontra Lewis Norton, acusado pela sua traição, e Bowman, sempre pronto a
matá-lo. Afortunadamente eles conseguem fugir, graças também à ajuda de um
grupo de mulheres guiadas pela bela e determinada Elizabeth.
Digna
de citação, a Batalha de Kennesaw Mountain, admiravelmente reproduzida por
Wilson no início de “Trois hommes pour Atlanta”.
N. C.: Página 76. Blueberry, Jean Giraud. |
Complôs!
(julho de 1864)
Após o
abandono de Wilson, que retornou à Nova Zelândia, a série foi confiada às
talentosas mãos de Michel Blanc-Dumont, renomada autor do esplêndido “Jonathan
Cartland”. Sobre ele Charlier disse: “Se não tivesse tido a sorte de
encontrar Jean Giraud, seria com Michel Blanc-Dumont que teria desejado
lançar-me na longa saga de Blueberry.” (citado em “L’univers de
Blanc-Dumont”).
Em “La
Solution Pinkerton” (“A Solução Pinkerton”) e “La Piste des maudits” (“A Pista
dos Malditos”), os autores traçam muito bem o clima sanguinário da Guerra
Civil, cujos destacam figuras duvidosas entre as quais Éléonore Mitchell, bela
e mortal espiã nortista.
Um
complô, idealizado por Alan Pinkerton, fundador da famosa homônima agência
investigativa, deve eliminar, com o engano, o valoroso General Sulista
John-Bell Hood, mas, afortunadamente para ele, existe Mike, pronto a salvar-lhe
a vida e impedir uma vergonhosa página para o governo de Lincoln: como
agradecimento, o General o obriga a trabalhar para os rebeldes. No curso da
aventura, se encontra com o eterno rival, Bowman.
Os
autores de concedem das citações: de Clark Gable, inesquecível intérprete de “E
o Vento Levou” ao Sargento Chesterfield e Cabo Blutch, protagonistas da
hilariante série “Les Tuniques bleues”.
A arte
de Blanc-Dumont, limpa, rotunda, precisa nos mínimos detalhes, contrasta com
aquela de Wilson, mesmo demonstrando um erro no rosto de Blueberry,
distanciando-se da fisionomia canalha, que constitui a principal característica
do personagem.
O
volume “La Piste des maudits” se fecha com um artigo no qual Corteggiani
completa as notícias relatadas por Charlier na imaginária biografia apresentada
em “Ballade pour un cercueil”. Aprendemos, portanto, que Mike nasceu em 30 de
outubro de 1843, de Cynthia Donovan, falecida ao dar-lhe a luz, e de Slim Phis
Donovan, proprietário de Red Wood Grove. Amamentado pela babá de cor Mamie
Deborah, cresceu rebelde a qualquer tipo de autoridade, permanecendo até aos 12
anos um pequeno selvagem analfabeto, mas, hábil em atirar e cavalgar. Enviado a
um colégio de jesuítas em Nova Orleans, aprende rápido a frequentar bordéis, a
fumar e beber, até que é devolvido à casa do pai ao som de chicotadas. Aos 18
anos, se noiva com Harriet, mas, essa história é conhecida.
No
futuro, é prevista uma prisão sua (é uma mania dos autores) em Andersonville,
de cuja fugirá para retornar à Louisiana, entre ruínas infestadas de fantasmas,
à procura das próprias origens.
O
Xerife (novembro-dezembro de 1868)
Nos
anos Oitenta, alguns produtores norte-americanos propuseram a Charlier e Gir
uma adaptação de Blueberry, em cuja o herói era privado do braço direito,
substituído por uma prótese multifuncional, mais em sintonia com James Bond do
que com histórias western: obviamente o projeto foi abandonado.
Em
seguida, Gir retoma aquele projeto, desenvolvendo a ideia de base com outros
personagens e sem amputação, criando “Marshal Blueberry”, segunda série
paralela, na qual os acontecimentos são situados cronologicamente entre
“Général Tête Jaune” (“General Cabeça Amarela”) e “La Mine de l’Allemandu
perdu” (“A Mina do Alemão Perdido”); os desenhos dos dois primeiros volumes são
confiados ao belga William Vance, notório autor de “Bruno Brazil” e “XIII”,
aqueles do terceiro a Michel Rouge, autor de “Comanche”.
Ainda
uma vez, Mike tirou o uniforme militar para ser o xerife na cidadezinha de
Heaven e desmascarar uma organização dedicada ao tráfico de armas, que
abastecia o renegado Chato e os governos da América Central.
Os
textos de Gir e os desenhos de Vance se revelam recíprocos; a trama parece um
remanejamento daquela de Forte Navajo, mesmo se o ritmo é diferente, mais
premente, tanto por competir com a melhor tradição cinematográfica, abandonam
perseguições à diligência, trens, ataques índios a forte e fazendas isoladas; o
final deixa em suspense o leitor, com Mike aparentemente assassinado. O todo é
resultado agradável da limpeza do traço e da paginação do tipo clássico de
Vance.
Após
sete anos, sai o terceiro episódio, “Frontière sanglante” (“Fronteira
Sangrenta”), em cujo reencontramos o nosso herói curado por Tess Bonaventura,
uma bela moça dedicada a salvar as prostitutas. Saído da cama da bela, Mike
resolve o caso com a ajuda de Red Neck.
Rouge
consegue não vacilar diante de dois mestres do calibre de Gir e de Vance.
Blueberry
segundo Mœbius
Quando
diz respeito ao futuro de Mike, Gir afirma que, embora tenha abandonado o
Exército, não significa que o Exército tenha se esquecido dele.
Existe,
pois, dois projetos de histórias incompletas, temporariamente trancadas no baú
do autor pelo veto dado pelos herdeiros de Charlier, que julgaram fora do
espírito do personagem. Em “Viva Nez Cassé” (1995), quinto episódio da série
“Les Gringos”, escrito por Vidal e desenhado por Victor de la Fuente para a
Dargaud, no papel de coadjuvante há um Blueberry envelhecido, mas eterno
lutador, simpatizante da causa de Pancho Villa. Tal história forneceu o esboço
para um projeto denominado “Blueberry 1900”, dedicado, precisamente, à
‘terceira idade’ do nosso herói. A ideia básica, que deveria apresentar Mike ao
ocaso, retirando-se para viver em reserva de índios Hopi, consistiria em um
delírio xamânico muito violento. “Aquilo que existe de interessante e de inovador
em “Blueberry”, é que está em perpétuo conflito com o poder. Tenho então
absorvido esse aspecto do personagem, que “Blueberry 1900” será uma pura
história de poderes. De poder político e de poder xamânico.” (Giraud). O outro
projeto, intitulado “Fort Mescalero”, é centrado em uma atmosfera mágica e
onírica, incomum para o personagem.
Histórias,
então, mais adaptadas a Mœbius do que a Gir, as quais fazem compreender a
relutância dos herdeiros de Charlier e testemunham a difícil coexistência dos
dois universos concebidos por esse grande autor dos quadrinhos, sustentado por
uma vontade contínua de permanecer no jogo, de não parar nos louros
conseguidos. Em todo caso “Os heróis não morrem nunca! Na vida deles, uma
vez contada, se podem descobrir mil aventuras em mil interstícios. Outros se
encarregarão, outros desenhistas, outros roteiristas (...) Blueberry não é
Tintin (...) A aventura continua!” – afirma Gir (Favre e Pissany Yvernaut).
Michel Blanc-Dumont, Desenho (1998). N. C.: Página 77. |
"Lucky Luke, Blueberry... e gli altri", à esquerda. |
Lucky Luke,
Blueberry... e gli altri © Bruno Caporlingua, Mauro Giordani, Nando
Messina, Associazione Culturale Edo Club 2001
Fontes da imagens: Afrânio Braga: página 62 e parte de sua BBteca/gibiteca; Comic Art Fans: página 64; Catawiki; página 67; jmcharlier: página 68; Dargaud: páginas 69 e 77; Afilactera: página 70; Comicwiki: página 72; Delcampe: página 73; Orano Factory: página 73.
Afrânio
Braga
Nenhum comentário:
Postar um comentário